30/08/2011

Histórias de uma remuneração variável

Há alguns anos atrás, comecei a trabalhar numa empresa que pagava bônus para os funcionários uma vez por ano.

O valor bônus, ou da "remuneração variada", estava atrelado, em teoria, ao desempenho profissional do funcionário e os valores não eram divulgados senão para a própria pessoa.

Dessa maneira, todo ano criava-se duas TPBs, uma tensão pré e pós bônus.

Na pré bônus, as pessoas praticamente paravam de trabalhar uma semana antes da divulgação, e todas as conversas giravam em torno desse mesmo assunto.

Na pós bônus, entrava o desespero de tentar descobrir quanto as outras pessoas tinham ganhado. Estar feliz ou não com o valor recebido era um conceito totalmente relativo, tudo dependia se os seus vizinhos tinham ganhado mais ou menos que você.

Alguns realmente ficavam felizes e outros genuinamente bravos, mas o melhor eram os dissimulados. Tinha a ala dos que se diziam chateados, bravos e/ou magoados, mas o discurso não convencia e a roda de apostas sinaliza que o bônus do cara tinha sido alto.

E na ala contrária estava a pessoa que descrevo abaixo.

Como quem conta um segredo de estado, o Fulano sussurrou para mim:

"Você está começando agora, deixa eu te ensinar. O grande lance é trocar de carro logo após o bônus. Assim, mesmo que você tenha recebido ZERO, todas as pessoas vão achar que você ganhou bem..."





17/08/2011

Entrevista de Demissão

Um amigo, o Fulano, pediu demissão da empresa que trabalhava porque tinha recebido uma oferta melhor de uma outra empresa.

O gerente da área, o Ciclano, não queria que ele saísse. Estava vivendo um momento muito complicado na empresa, pois a maioria das áreas sob sua responsabilidade estavam muito abaixo da meta e ele não queria ficar com um "jogador" a menos nesse momento. Contratar um novo funcionário demoraria um certo tempo, o que só pioraria as coisas.

Então, ele tentou convencer meu amigo a ficar.

Primeiro disse que conseguiria aprovar um aumento de 10%. Meu amigo disse que não era somente salário, a proposta profissional era melhor, ele teria mais responsabilidades e realmente achava que era melhor para ele. 

Então o Ciclano argumentou que ali ele já conhecia todos os problemas e defeitos da empresa, e que no outro lugar teria de aprender tudo do zero. Usou a frase "aqui você já sabe onde são as rachaduras do vaso sanitário. Lá você ainda vai ter de descobrir, e corre o risco de piorar a rachadura... "

Tentou ainda dizer que os novos chefes e colegas de trabalham poderiam ser maus-caracteres. De novo afirmou que ali ele já conhecia todo mundo.

Sem muito mais argumentos, pediu, como última carta na manga, para o diretor da área conversar com o Fulano.

Reunião marcada.

No horário exato, o Fulano parou na porta da sala do tal diretor. Como o diretor estava de cabeça baixa, lendo um documento, o fulano deu três toques na porta.

O diretor levantou a cabeça.

"Boa tarde. Eu posso entrar?"

"Sim, claro. Você é o...?"

"Eu sou o Fulano."

Silêncio.

"Eu trabalho com o Ciclano, ele pediu para eu vir falar com você."

"Ah! Você é o carinha que pediu demissão! Por que você pediu demissão mesmo?"

"A empresa X me fez uma outra proposta, que eu achei muito boa para meu crescimento profissional."

"Ah! Eles vão pagar mais do que você tem aqui?"

"Sim, a proposta é um pouco maior sim."

"E tem mais alguma coisa?"

"Não, acho que é só isso mesmo."

"Então, parabéns. Boa sorte no seu novo emprego."

E assim, o Fulano mudou para a outra empresa.

10/08/2011

O tipo de pessoa que trabalha entre nós...

Fui de carona no carro de outro gerente num evento da empresa.

Na volta, ele parou num posto para abastacer e pediu para colocar R$50 de gasolina.

Quando o frentista terminou, veio na janela do carro para devolver a chave e receber o dinheiro.

"Eu já te dei R$50".

"Não, o senhor não deu. Me deu somente a chave do carro."

"Você está mentindo. Eu já te dei o dinheiro, tenho certeza disso. Chama o seu gerente."

Virou para mim e disse: "Que ladrão! Você viu que eu dei o dinheiro para ele, não viu?"

Eu, que tinha ficado o tempo inteiro lendo emails no blackberry, respondi, meio envergonhado, que não, infelizmente, não tinha visto.

O gerente do posto chegou, e perguntou muito educadamente o que tinha acontecido.

O meu colega contou a versão dele. E completou:

"Eu tinha R$50 na carteira e não tenho mais." - disse, abrindo a carteira, olhando dentro e fechando-a num gesto teatral.

O frentista se defendeu, e ficou olhando para seu gerente com cara de "eu não fiz nada...".

Impasse criado, o gerente achou por bom terminar aquilo da única maneira razoável. Disse que não acredita que o frentista tinha roubado o dinheiro, provavelmente o dinheiro tinha apenas caído, então que nós também poderíamos ir.

O meu colega ainda gritou um "ladrão" antes de arrancar com o carro.

Assim que saímos do posto, ele virou para mim e disse:

"Cara! Quando eu abri a carteira, a nota de R$50 estava lá!!!"

"Como assim? Você não tinha dado o dinheiro para o cara?"

"Eu achei que tinha, mas não tinha. O dinheiro está aqui na minha carteira."

"E porque vc não falou?"

"Eu? Me humilhar para um frentista? De jeito nenhum."

E terminou com um ar de quem sabe das coisas:

"Com certeza o cara já deve ter roubado alguém mesmo..."

E eu fiquei ali, catatônico.

09/08/2011

Sala Virtual

A Empresa B resolveu, há algum tempo atrás, extinguir as salas dos gerentes e diretores.

Todos se sentariam junto com os funcionários "comuns" numa grande mesa. Não haveria nenhum tipo de separação entre uma posição e outra nessa mesa. 

Apesar de muitos acharem que a mudança era apenas para colocar mais funcionários por metro quadrado, a idéia foi amplamente divulgada como uma maneira de aproximar a gerência e a alta gerência das atividades diárias da empresa, tornando as decisões mais ágeis e próximas da realidade.  

Apesar de alguns egos feridos pela perda da sala, no geral todos se adaptaram muito bem. E realmente a comunicação fluiu melhor entre todos os níveis.

Um dia a empresa A fez uma fusão com a empresa B, que era muito boa, mas um pouco mais tradicionalista e hierárquica.

Um gerente da empresa B, que foi até promovido a diretor após a fusão, estava feliz com a promoção, mas extremamente incomodado com a ausência de sala.

Um dia acordou com uma idéia brilhante, que colocou em prática assim que chegou na empresa.

A secretária deveria orientar todas as pessoas que não poderiam mais falar direto com ele. Teriam de marcar um horário com ela antes.

Como os diretores e gerentes sentavam na mesma mesa que sua equipe, a situação que ocorria na prática era a seguinte:

Se o funcionário que sentava ao lado do diretor precisasse falar alguma coisa com ele, era preciso se levantar, dar a volta na mesa - porque a secretária sentava do outro lado - e perguntar para a secretária se o diretor tinha algum horário livre.

Ela então perguntava se era urgente. Se a resposta fosse sim, marcava um horário mais cedo e se fosse não, marcava um horário mais tarde.

Após o agendamento da conversa, o funcionário voltava para o lugar dele, e esperava pacientemente chegar o tal horário em que poderia, ali da sua cadeira mesmo, falar o que precisava com o diretor.

A conversa com a secretária acontecia em voz alta, mas o diretor, fechado em sua sala virtual, ficava impassível como se nada ouvisse.

03/08/2011

Pesquisa de Clima Organizacional I

Muitas empresas adotaram uma pesquisa interna para medir a satisfação dos funcionários com a empresa, com os gerentes diretos e indiretos e até mesmo com o seu próprio trabalho.

E assim a empresa poderia se basear nas respostas dadas pelos funcionários para implementar melhorias gerais.

A idéia é fantástica, mas a execução é sofrível.

Já trabalhei em 3 diferentes empresas, e infelizmente em nenhuma delas vi essa pesquisa funcionar da maneira que deveria.

E as razões para isso são várias:
- em primeiro lugar, as pessoas tendem a reclamar de tudo quando elas estão muito insatisfeitas com alguma coisa. Digamos que a tolerância dela com problemas menores chega a zero se ela está muito insatisfeita com, por exemplo, o salário dela. Na pesquisa essa pessoa dá nota baixa igual para todos os itens, e fica quase impossível identificar qual é realmente o item que trouxe aquela insatisfação toda.
- em segundo lugar, se uma área tem resultados pífios, isso normalmente é usado contra o responsável por aquela área. Mesmo se os funcionários estão insatisfeitos com a empresa, a "culpa" é do diretor, e melhorar os índices da pesquisa passa a fazer parte da meta daquele diretor, mesmo que ele não tenha gerência nenhuma sobre alguns itens.
- em terceiro lugar, quase ninguém reaje bem a críticas. Mesmo se a pessoa conseguiu isolar o problema real de insatisfação, mesmo que esse problema seja causado pelo seu gerente direto, não necessariamente ele vai atuar para resolver aquilo.

O exemplo abaixo aconteceu para ilustrar esse último ponto.

Uma determinada área ficou com resultados muitos mais baixos que a média das outras áreas.

Assim, os diretores responsáveis, e tinha mais de um, pois era uma área grande, decidiram fazer uma reunião com todos os funcionários para tentar entender o motivo de uma avaliação tão ruim.

A reunião começou leve, e alguns funcionários até começaram timidamente a pontuar um ou outro item.

Logo pararam, porque os diretores começaram a se sentir incomodados e a discordar da percepção geral.

O ápice aconteceu quando um dos gerentes viu que 75% da área respondeu que achava que trabalhava muito.

Vocês acham que trabalham muito? Silêncio.

Vocês realmente acham que trabalham muito? Silêncio.

Eu vou falar para vocês que vocês não tem a menor idéia do que é trabalhar muito, mas vocês vão ter agora. Assim a pesquisa do ano que vem pelo menos vai ser ruim, mas por um motivo verdadeiro.

02/08/2011

Sutilezas

Uma amiga foi convocada a fazer um treinamento sobre gerenciamento de pessoas.

Ela ficou feliz com o convite, mas ficou brava ao descobrir que teria de se deslocar até o Centro de Treinamento da empresa, em outro estado.

Ficaria longe dos seus filhos uma semana.

Ficou mais brava ainda quando descobriu que teria de dividir o quarto com outra pessoa.

Muito franca, decidiu reclamar com o chefe.

Fulano! Fiquei sabendo que, além de passar uma semana fora de casa, vou ter de dividir o quarto com alguém que eu não conheço!

O chefe deu um suspiro resignado e respondeu sem nem levantar a cabeça:

Dividi o quarto com alguém que conheço e também não foi bom.